Jovens
de um novo tempo, despertai!
Um escritor
experiente se encontra diante do grande desafio narrativo: explicar o mundo e
sua falta de sentido ao filho que sofre um tipo de deficiência mental. Com este
enredo, o autor japonês Kenzaburo Oe elaborou a obra-prima “Jovens de um Novo
Tempo, Despertai!”, que ganhou uma edição caprichada no Brasil da Companhia das
Letras, com direito até a um charmoso marcador de página de tecido.
Com um texto
lúcido, ainda que carregado de emoção, Oe não cai no sentimentalismo extremo e
evita com classe narrativa os lugares-comuns. Apresenta a deficiência do filho
a partir de questões existenciais pertinentes a qualquer um. Por exemplo: a
morte. Parece partir da preocupação em explicar a morte ao filho todo o projeto
do tal “manual de definições do mundo, da sociedade e do ser humano”.
Após uma
crise nervosa do filho, pai e mãe percebem como involuntariamente usavam o fim
da vida como uma ameaça de futuro nas discussões com o garoto, um adolescente
em formação. “Minha mulher e eu ficamos abatidos, com vergonha de nós mesmos ao
pensar nas vezes sem conta em que repetimos a pergunta: ‘Que é que você vai
fazer depois que nós morrermos, Iiyo?’”.
O narrador
está certo que foram diálogos como esse que fizeram seu filho compreender o
futuro como algo a se temer. E a morte, como alguma coisa que antes de
acontecer a seus pais, seria conveniente que acontecesse a ele. “Depois de
vestir o uniforme escolar, meu filho se senta todas as manhãs no tapete da sala
de estar. Separa os joelhos gordos, planta as nádegas firmemente no chão e abre
o jornal matinal. Apenas para ler o obituário. (…) ‘ Ah, vejam outra vez quanta
gente morreu esta manhã!”.
Oe escreve
com a fluidez de quem está muito próximo e íntimo ao tema. Prêmio Nobel em
1994, o autor tem um filho com deficiência mental e o apresenta em sua obra
frequentemente. Os capítulos que compõem “Jovens de um Novo Tempo, Despertai!”
foram originalmente publicados em jornais japoneses entre julho de 1982 e junho
de 1983.
Chama atenção
na narrativa de Oe a proximidade que se estabelece com a literatura ocidental.
William Blake é uma importante referência, inclusive os títulos do livro e dos
capítulos foram tirados da obra do poeta inglês. Há várias citações de Blake e
parte de versos dele algumas das imagens construídas pelo narrador em seus devaneios.
“Jovens de um
Novo Tempo, Despertai!”
Autor: Kenzaburo OeEditora: Companhia das Letras
Tradutor: Leiko Gotoda
Páginas: 320
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